Sentada na pedra, diante da lagoa, a pescadora anseia por um peixe, a alegria de erguer o troféu, observando o movimento das espécies coloridas, na brincadeira de esconde-esconde, entre arbustos aquáticos. No espelho de água, cristalino, a pintura de rastros flamejados do sol que se despede da primavera e toma o caminho que conduz ao outono. Ao redor, alamedas de plátanos, sinuosas, pavimentadas com muitas camadas de folhas envelhecidas. Esparsas, em conivência pacífica, moitas de bambus.
Às vezes, tocada pela solidão, libera o pensamento, excursiona montada em nuvens que se assemelham a cavalos brancos, selvagens, livres. Não se incomoda com a espera, nem se aflige ao lembrar que é difícil pescar sem varas, anzóis, iscas, redes. O tempo humano, marcado por minutos e horas, nada significa para quem tem a certeza de encontrar.
Foi depois do prolongado suspiro, no momento de recolher os sonhos, acenar para o poente e dar adeus ao dia. Primeiro, os pássaros. Silenciaram, de repente. As árvores permaneceram imponentes, em posição de sentido, à espera das ordens do general vento.
Os olhos da pescadora capturaram a figura que emergiu, de magnífica estátua, a pele dourada, de bronze, maravilhoso homem-peixe esculpido por artistas divinos. Ao se mover, com vigor e sensualidade, ganhou vida, transformou-se em jovem, formoso, destemido, forte, inquieto. Pareceu-lhe tratar-se de estrangeiro, talvez um descendente de Netuno que emigrou do mar, herói disposto a conquistar novo território, ampliar seus domínios, saciando a sede de água doce na mansidão da lagoa. Foi o que lhe ocorreu, de pronto.
Ele parecia resplandecer. Nu, musculoso, atlético, ardente, perfumado. Mesmo à distância, era possível sentir o odor adocicado de flores silvestres que se desprendia daquele ser celeste, impregnando a atmosfera. O presságio do perigo percorreu a mente da pescadora, respingou arrepios pelo seu corpo, que chamejava, devorado por incêndio devastador.
Antes que ela pudesse esboçar fuga, encontrar uma cabana abandonada para esconder o medo, ele, com mãos de artesão, fabricou uma flauta, abrindo um tubo de bambu, que foi perfurado com espinhos. Ao leve contato com os lábios, o sopro mágico produziu a balada, romântica, sons suaves, melódicos, lembrança de Grieg, Liszt, Chopin.
Sob efeito hipnótico, ela permaneceu imóvel, aguardou a aproximação. Não quis decifrar a linguagem gravada nos olhos do estranho. Aceitou ajuda para se erguer. Mãos dadas, caminharam pelas margens, comunicaram-se apenas com toques, trocaram sorrisos de criança, repartiram frutas frescas, colhidas da uvaieira, umedeceram os lábios com framboesas. Vieram beijos, muitos beijos. Então se deitaram, abraçados. A noite se maquiou de estrelas e desfilou o luar, manto bordado de prata para agasalhar os amantes.
Ao despertar, na alvorada das aves, a pescadora estava novamente só. Mas não se deixou conduzir pelo barco da tristeza. No íntimo, ela sabia: não adiantava chorar a ausência em portos e praias, na incerta esperança do regresso. Marinheiro não gosta de terra firme.
Ela se permitiu cantarolar, tateou a barriga. Sim, o peixe fora fisgado, estava em seu aquário, em águas profundas. Em breve, brevemente, voltaria aos seus braços, agora com feições suaves de bebê.